31 de agosto de 2010

Atelier


Esta é a parede principal do atelier, onde penduro variados trabalhos (patchwork, tear, bordado e aplicação). Sobre a mesa estão algumas mantas e xales e no encosto da cadeira há um pequeno tapete de barbante (tear). No tear de pedal há um têxtil que é apenas teste de material.
Estes trabalhos já são antigos. Os recentes ou ainda não estão prontos, ou não são para pendurar. São eles: um tapete com ponto de arraiolos, uma colcha em quadradinhos afegãos de crochê, uma blusa de lã masculina em tricô, um cachecol com babados, um panô pequeno no tear e o bordado de um fragmento da Tapeçaria de Bayeux. São todos trabalhos grandes, encaro bem as empreitadas duradouras... Os pequenos terminam rápido demais.

30 de agosto de 2010

O museu ideal

Todo mundo que gosta de têxtil, no Brasil, está deserdado de publicações importantes e museus de qualquer espécie. O fazer têxtil, um dos pilares da civilização humana, não encontra, aqui, tanto quanto eu conheço (e tenho procurado bastante...), atenção de pesquisadores (para inventariar o que é nosso), de editoras, de curadores ou museólogos. Até as publicações estrangeiras não nos chegam com facilidade... O assunto é morto.
Bordado família Dumont - detalhe
Como movimento mais recente, a década de 70 conheceu uma efervescência de artistas que usaram o têxtil para exprimir sua arte. Tal movimento foi descrito por Rita Cáurio em seu Artêxtil. Há também alguns catálogos de exposição e uma outra publicação muito bonita que consiste numa coletânea de obras e artistas. É tudo quanto eu conheço. Alguns artistas alcançaram grande reputação, mas sua época já passou. Jacques Douchez, Norberto Nicola, as Colaço mãe e filha, Burle Marx (que só fazia o cartão...) e tantos outros parece não terem deixado discípulos... O único artista que eu conheço em atividade é Henrique Schucman com a tapeçaria (de tear) e a família Dumont com os bordados. Minha ignorância é grande. Procuro, com as ferramentas que a internet me proporciona, ampliar meu conhecimento sobre toda atividade têxtil. Tarefa ingrata! Quase inexistente no Brasil. Fragmentada lá fora. Interessa-me o têxtil em todas as suas formas: artístico e utilitário (mas não industrial), oriundo de tear ou de tricô, crochet, renda, costura, bordado. Interessa-me sobremaneira a atividade criativa que ele pode proporcionar: penso nas tapeçarias (de chão e de parede - kilim ou gobelin), nas esculturas tecidas, nas aplicações, no patchwork, nos bordados, as possibilidades são tantas... Procuro, nas bibliografias das publicações estrangeiras que me caem nas mãos, endereços de museus voltados ao têxtil. Aí a coisa se pulveriza: parece que ninguém se interessa pelo assunto de maneira abrangente. Têm-se têxtil arqueológico separado do têxtil artístico, separado do têxtil utilitário, separado pelas diversas técnicas, separado pelos povos do mundo. As técnicas têxteis são as mesmas em todos os lugares (pessoas do mundo inteiro se dedicam a fazer crochê, tricô, patchwork, bordado, tapeçaria) e atravessam a História como fazer contínuo, necessário, útil, belo, rico. Algumas técnicas são mais antigas do que outras (e fizeram a riqueza material ou cultural de povos inteiros), mas todas elas envolvem um material que é sempre o mesmo: fios, agulhas, teares.
Tapeçaria - Norberto Nicola
Inúmeros museus espalhados pelo mundo (quem dera poder visitar todos eles...) colecionam parcelas do fazer têxtil humano. Pensando bem, não poderia ser diferente. A menos que procedêssemos como um certo demente austríaco que tinha a pretensão de reunir tudo o que ele considerava "a grande arte" num museu único, com acervo saqueado de todos os demais... Não, não é viável. O museu de tudo não existe. O que me aborrece é que os livros não precisam ser assim: eles podem ser abrangentes, informativos, referenciais como um dicionário. Se este livro existe, alguém, por favor me avise que eu não sei.
Meu museu ideal seria assim: um prédio (real de preferência, mas um virtual já seria louvável) que mostrasse em seu acervo as variadas realizações que uma determinada técnica possibilita. Para todas as técnicas do fazer têxtil. Através da História e dos povos. Através do fazer feminino (e esse é um assunto interessantíssimo, por que a mulher ficou desde cedo associada a esse tipo de trabalho). Através da "grande arte" e da "pequena arte". Um espaço em que os têxteis da Bauhaus, biquinhos em panos de prato, cachecóis, gobelins, kilims, vestimentas étnicas bordadas, rendas de bilro, panos de Paracas, arte moderna, quilt livre (e não livre também) convivessem sem hierarquia, cada um segundo sua técnica. Tudo isto para mostrar o valor da inventividade humana, o poder de uma agulha, a versatilidade do fio, a permanência do tear.

27 de agosto de 2010

Cerâmica e tear

Cerâmica e tear
Têxtil (curso básico) e objetos cerâmicos decorativos
Faz bastante tempo que gosto de artesanato. Arte também. Livros e mais livros que exploram esse assunto se empilham em minha casa. Nenhum deles é definitivo. Isso não existe, felizmente. Assim temos sempre a oportunidade de procurar mais além, noutro livro, noutra pessoa, noutro lugar uma maneira nova de olhar o velho, porque tradição é isso: fazemos hoje aquilo que outros fizeram no passado. Fazemos melhor? Fazemos pior? Parei de buscar resposta para essa questão - importa que se continue fazendo para que as técnicas não pereçam, o que é sempre triste. Uma técnica que se pratica é uma conquista que se perpetua. Que seria de nós se tudo o que sabemos sumisse repentinamente de nossa memória? Que seria do homem, nu, perdido sob o manto das estrelas? Penso na tecnologia têxtil e na cerâmica como pilares da civilização. Claro que existem outros, mas esses são os que me interessam mais de perto. Não é espantoso que essas técnicas tenham atravessado a História quase imutáveis no essencial? Fibras de kevlar são tecidas em versões modernas dos velhos teares, a indústria cerâmica continua queimando o barro como faziam nossos ancestrais.

25 de agosto de 2010

Em alta velocidade

Anos atrás adquiri um tear "rabo de rato" e um de tricô (para fazer cachecóis) pelo mero fetiche do objeto.
O marceneiro que os fez trabalhou bem nas peças, arredondando os cantos e deixando tudo bem lisinho para não desfiar o fio.Os pregos de aço inox também estavam bem posicionados. Capricho que aprecio em qualquer trabalho. Pois bem, comprei mas não gostei de trabalhar com os teares. Rebelei-me contra aquilo que considerava "trabalho de preso": derrubar com agulha de crochê ponto por ponto. Acontece que eu estava envolvida com teares pente-liço e teares para gobelin e não dei atenção para as possibilidades de uso do rabo do ratinho... até agora. A Evelyn, minha professora de tricô (evelynartesanato.blogspot.com), criou uma peça que resolvi fazer também e lá se vão mais de dez horas de trabalho para fazer os cinco cordões... O resultado aí está, ficou bom, mas eu enlouqueci com o tempo gasto para fazê-lo e só tive sossego quando encontrei uma fabulosa maquininha para fazer a mesma coisa em altíssima velocidade (cinco cordões em uma hora).
Agora, como diz o Chico, "haja pescoço pra enfiar" tanto cachecol. A maquininha encontrei pela internet (pontodosbordados.com.br), onde tive o prazer de conhecer a Joana, que pelo jeito também gosta de aventuras em alta velocidade... Estaremos as duas perseguindo a adrenalina contida nas ações rápidas? Artesanato a todo vapor? Rabo de rato high speed? Não sei quanto a ela, foi só uma brincadeira da minha parte; quanto a mim, reservo o "trabalho de preso" para outras atividades de que gosto mais.

20 de agosto de 2010

"Amor em cada ponto"


Estive selecionando fotos relevantes para publicar e encontrei uma que ilustra o gesto carinhoso que acompanha pessoas que se cuidam mutuamente. Lãs e agulhas permeiam esta cumplicidade. O tricô que nela aparece é todo feito de carinho e cuidado. Tricotamos para aqueles que amamos. Tricotamos para nossos filhos e netos. Que valor tem uma roupa que qualquer um pode adquirir por um punhado de notas? O suéter que produzimos com "muito amor em cada ponto" (como diria a avó do Bob Esponja) tem um valor agregado tão alto que moeda alguma pode alcançar seu preço. Não se trata de um produto destinado a alguém sem rosto, mas de algo que produzimos para alguém cujo nome nos diz respeito.
Acredito nisso. E acredito tanto que adoraria produzir uma cota de malha para proteger os que me são caros. Como essa que está aí. Na minha fantasia, o metal se dobra e se enlaça sob o comando das agulhas. Ele se amolda, gentil, aos contornos da carne. É como se Aracne tecesse com os fios secretados por um bicho da seda alimentado por Hefaistos em suas forjas vulcânicas. Coisa mais fantástica que a mortalha de Laertes.

19 de agosto de 2010

Agulhas na alma

Vaso em cerâmica com o qual presenteei uma amiga
Nasci com agulhas na alma. Não faço distinção: agulhas de tricô, de crochê, de bordado, de tapeçaria, de sacaria, de costura e até de seringa, o Dr. Nilo que o diga! Tenho agulhas suficientes para aparelhar até a geração de meus bisnetos... Mas isto não importa. A habilidade para manuseá-las todas vem vindo ao sabor dos interesses que se alternam a cada momento.
Por hora, tricoto. Estou fazendo minha terceira blusa para este inverno que (Deo gratia!) se prolonga. Escolho modelos com técnica cada vez mais apurada para alegria de minha professora de tricô. E eles vão saindo cada vez melhores. Tenho um prazer nada secreto de poder apontar para um objeto e dizer "eu que fiz". Tanto que até os pratos, xícaras e travessas de casa levam meu nome. Tempos em que eu fazia cerâmica para expurgar alguns males. E mosaico também. Fiz um grande, com desenho de muiraquitãs que levou vários anos para ser concluído, pois cortar pastilha de vidro com alicate é um talento para poucos. Aplicá-lo na parede, então, exigiu o métier de um pedreiro habilidoso. Minha mão não dá para isto. Mas voltemos às agulhas. Não fosse por elas, meu tempo ocioso me sufocaria. Por intermédio delas minhas mãos como que prendem o instante mesmo em que o amor me habita e me faz gerar objetos vários. É assim, bem feminino que esse negócio me parece. Homens que bordam têm o meu respeito.